Cacau em Crise
Euforia e queda, produtores baianos vivem montanha-russa com o preço do cacau
Depois de bater recorde mundial, valor do cacau despenca no Brasil e interrompe sonhos de modernização no sul da Bahia

“Quando todo mundo se animou, veio um banho de água fria.”
A fala de José Luís Fagundes, produtor de Igrapiúna, traduz o sentimento que tomou conta de centenas de agricultores no sul da Bahia. Até poucos meses atrás, o cacau era promessa de retomada. Agora, virou incerteza.
No final de 2024, o preço do cacau disparou no mundo. África teve quebra de safra, e o Brasil surfou na onda. Mas o otimismo durou pouco. Em 2025, as cotações recuaram, e a indústria passou a ditar os preços no Brasil com base na bolsa futura de 2026 — bem mais baixa. Resultado? O produtor, mais uma vez, ficou com a conta.
Na cooperativa de Ituberá, os comentários são os mesmos: “Os grandões brigam lá fora e vem bater na gente aqui.” Com poucas empresas controlando o mercado — Cargill, Barry Callebaut e Olam/Ofi —, a margem de negociação é quase nula. Segundo a ANPC, a diferença chegou a R$ 85 por arroba em agosto.
A frustração cresce junto com os boletos. Josenilda Silva, de Jitaúna, adiou o sonho de comprar equipamentos e instalar energia solar na lavoura.
“O retorno nunca é leal com a gente”, diz. A tarifa de 50% imposta pelos EUA complicou ainda mais: R$ 180 milhões em perdas estimadas até o fim do ano.
O descompasso entre a cotação internacional e o preço pago ao produtor escancara uma cadeia desigual. Setenta por cento da produção nacional está nas mãos de pequenos e médios agricultores, sem fôlego para segurar o cacau e esperar uma melhora.
Na prática, o cenário é o mesmo de sempre: falta de valorização, desconfiança na indústria e o risco constante de ver o esforço de anos desmoronar com uma decisão de mercado. Para quem vive do cacau, o gosto amargo do chocolate vem antes mesmo da colheita.